Um oficial inglês, destacado na longínqua província de Lahore, na Índia, é surpreendido com enigmático telegrama enviado de Londres por seus sobrinhos, Jorge e Flávio. Na certeza de que se tratava de gravíssima noticia, transmitida em código secreto, recorre o interessado a um matemático, e este esclarece por completo o mistério do telegrama cifrado.
O caso, em poucas palavras, foi o seguinte:
Nesse tempo, o Coronel Charles Luse servia em Lahore (na Índia). Uma tarde chegou ao coronel estranho e enigmático telegrama, vindo de Londres, enviado por seus sobrinhos Jorge e Flávio.
Um atentado contra o vice-rei da Índia, ou um assalto de fanáticos contra o quartel, não teria causado maior surpresa ao pacato Coronel Luse. Aquele inesperado telegrama de seus dois sobrinhos, enviado de Londres, com nota de urgente, deixara-o verdadeiramente assombrado.
O ilustre militar leu e releu várias vezes o misterioso despacho:
Coronel Luse – Lahore – S. J. II – 12. 13. S. P. C. – 16. 7. 6. – Jorge e Flávio.
Não há dúvida. Alguma notícia sensacional, referente a assunto gravíssimo, era enviada em código secreto. Como traduzir a mensagem? O coronel, sem quebra de sua dignidade de súdito britânico, pediu o auxílio de seus colegas de regimento. Recorreu aos exímios charadistas e nada conseguiu. Apelou, afinal, para um matemático famoso, chamado Mac Munn, que se achava casualmente na cidade em viagem de turismo.
O matemático analisou o telegrama, consultou vários livros e declarou, finalmente:
- Os jovens Flávio e Jorge, de Londres, mandaram dizer ao Coronel Luse, em Lahore, o seguinte:
Esperamos partir em breve; muita coisa devíamos escrever, mas achamos melhor não gastar papel e tinta e transmitir pessoalmente todas as noticias. Não pretendemos vê-lo só de passagem. Se Deus permitir, passaremos o inverno aí, para passearmos juntos. Saudações enviam os filhos de sua irmã.
O caso era de estarrecer. Como teria o matemático obtido o longo e minucioso texto de telegrama, interpretando números e letras daquela sucessão estapafúrdia inteiramente desconexa e absurda:
S. J. II – 12. 13. S. P. C. – 16. 7. 6.
Era isso que deixava o Coronel Luse, ainda mais assombrado.
Com imperturbável serenidade, o velho Mac Munn tomou de um exemplar da Bíblia, e mostrou que o telegrama misterioso era de uma clareza cristalina. Citava, apenas, quatro versículos da Bíblia, o livro de Deus.
“S.J.” significa “São João”; “S.P.” queria dizer “São Paulo”; o “C.”, a seguir, é a abreviatura de “Coríntios”. Os números indicavam os versículos correspondentes. O matemático se limitara, portanto a ler a Bíblia, nos trechos apontados.
Vamos transcrever as citações evangélicas que formavam, na integra, o texto do telegrama que o matemático Mac Munn tão bem soube interpretar. Destaquemos a primeira parte:
S.J. II – 12. 13.
quer dizer, apenas:
Segunda Epístola de São João, versículo 12 e 13.
Esses versículos são:
12 – Muita coisa tenho que escrever-vos, porém, não quis com papel e tinta, mas espero ir ter convosco e falar de boca a boca, para que o nosso gozo seja cumprido.
13 – Saúdam-te os filhos de tua irmã eleita. Amém.
Vejamos, agora, a segunda parte do despacho telegráfico:
S. P. C. – 16. 7. 6.
que indica, claramente, de acordo com as notações usuais:
Primeira Epístola de São Paulo aos Coríntios, capítulo 16, versículos 7 e 6.
Os versículos citados são:
6 – E bem pode ser que fique convosco e passe também o inverno, para que me acompanheis para onde eu for;
7 – Porque não vos quero agora ver de passagem mas espero ficar convosco se o Senhor assim permitir.
Resolvido o problema, rejubilou-se o Coronel Luse com a original ideia dos jovens, e para mostrar que ele também conhecia a Bíblia, resolveu acusar o recebimento do telegrama charadístico por meio de outro telegrama não menos enigmático. E mandou para seu sobrinho Flávio (o mais velho) o seguinte aviso:
Flávio Luse – Londres – S. P. T. II – 4. 9. S. P. F. 21 – Tio Charles.
Duas são as citações bíblicas que formam o texto dessa resposta:
Refere-se a primeira ao versículo 9 do capítulo 4 da Segunda Epístola de São Paulo a Timóteo:
29 – Procura vir ter comigo depressa.
A outra parte contém o versículo 21 da Epístola de São Paulo a Filemom:
21 – Escrevi-te confiando na tua obediência sabendo que ainda farás mais do que digo.
E a Bíblia, dessa maneira, serviu pela primeira vez, como código secreto para uma modesta correspondência telegráfica entre sobrinhos e o tio.
Para aqueles que cultivam a velha Kabbala, com todos os passa de um emaranhado código secreto, e as verdades contidas na Sagrada Escritura só poderão ser reveladas aos homens com o auxilio de fórmulas e combinações matemáticas.
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